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O Cipeiro, a súmula 339 do TST e A extinção do estabelicimento

 

Em que pese a garantia de emprego contra despedida arbitrária que protege o chamado “cipeiro”, empregado integrante da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA,  há situações previstas na Consolidação das Leis do Trabalho que correspondem exceções a essa garantia prevista no artigo 10, inciso II, letra a, do ADCT da Constituição Federal.

Com efeito, estabelece o artigo 165:

“Art. 165. Os titulares da representação dos empregados nas CIPA(s) não poderão sofrer despedida arbitrária, entendendo-se como tal aquela que fundar em motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro.

Parágrafo único. Ocorrendo a despedida, caberá ao empregador, em caso de reclamação à Justiça do Trabalho, comprovar a existência de qualquer dos motivos mencionados neste artigo sob pena de ser condenado a reintegrar o empregado.”

Não se trata, portanto, de “estabilidade no emprego”, mas sim de mera proteção contra o despedimento arbitrário. Nesse passo, em caso de demissão sob fundamento de ocorrência de motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro, não haverá nulidade do ato patronal, mas sim ato anulável, uma vez questionado em juízo pelo empregado cipeiro e comprovada a demissão imotivada. Quando muito, fala-se em “estabilidade provisória”, embora o termo não se afeiçoe a um rigor técnico, pois se é “provisória” a garantia, não é ela “estável”.

Abstraindo a questão semântica, pergunta-se: No caso de ocorrer a extinção do estabelecimento onde o cipeiro está lotado, se caracterizaria motivação suficiente para a sua despedida? E se houver simples desativação de setor ou atividade empresarial que não permita o aproveitamento do cipeiro pela empresa, embora esta não se extinga, subsistirá a garantia contra a despedida?

Esses temas têm sido enfrentados sistematicamente pela Justiça do Trabalho e pela doutrina juslaboralista, a ponto de ter gerado a Súmula 339 do Tribunal Superior do Trabalho que dita a regra geral de reconhecer a “extinção do estabelecimento” como motivo suficiente para afastar a hipótese de despedida abusiva do cipeiro.

Com efeito, estabelece o inciso II, da Súmula referida:

“...II - A estabilidade provisória do cipeiro não constitui vantagem pessoal, mas garantia para as atividades dos membros da CIPA, que somente tem razão de ser quando em atividade a empresa. Extinto o estabelecimento, não se verifica a despedida arbitrária, sendo impossível a reintegração e indevida a indenização do período estabilitário.”

Resta claro, portanto, que na hipótese de extinção do estabelecimento onde o empregado exerce suas funções, haverá motivo suficiente a justificar a demissão do empregado, seja de ordem técnica (impossibilidade de manter posto de trabalho sem atividade; ausência de motivação prática de manter integrante de comissão que não terá mais funções), seja de ordem econômica (evitar prejuízo econômico ao empregador, que não poderá aproveitar o trabalho do empregado).

Dessa forma, mesmo que a empresa continue a ter atividade em outras unidades de negócio, não há que se falar em garantia de emprego ao cipeiro, se o estabelecimento onde este prestava serviços restou extinto.

Dúvida persiste, entretanto, no tocante à desativação de um setor ou de uma determinada atividade empresarial que inviabilize a continuidade do vínculo de emprego, ou o aproveitamento do trabalho do empregado cipeiro em troca do salário pago, por conta de teimosas decisões judiciais esparsas que, exagerando no princípio protecionista entende que o cipeiro demitido faria jus a indenizações como se fosse titular vitalício de um posto de trabalho.

Nessa linha, alguns julgadores fazem equivocada leitura do item II, da Súmula 339 do TST, interpretando-a como restrição às hipóteses de despedida não arbitrária no caso de extinção do posto de trabalho, limitando-a à hipótese de fechamento total da empresa ou do local de trabalho. Tais decisões afastam-se, assim, do princípio reconhecido na própria Sumula de que o cipeiro não é detentor pessoal da garantia contra a despedida arbitrária. A leitura errada que fazem, portanto, é a de que a Súmula teria restringido, neste particular, as amplas hipóteses que decorrem do artigo 165 da CLT.

Nada mais incorreto, porém.

O artigo 165 da CLT não cogita da limitação aplicada nessas decisões que estão em completo descompasso com o que realmente pretenderam os senhores ministros do TST ao editarem a Súmula 339. A intenção clara da cristalização jurisprudencial foi a de afastar o entendimento de que, subsistindo a empresa, subsiste o emprego do cipeiro, mesmo que reste descaracterizada a lógica do contrato de trabalho. Tanto é verdade, que a própria Súmula dá destaque ao princípio de que o cipeiro não é detentor da garantia, mas sim os trabalhadores que se beneficiam dos trabalhos da CIPA. Persistem, entretanto, todas as hipóteses de demissões não arbitrárias decorrentes da extinção do posto de trabalho e da atividade empresarial.

Ora, a manutenção de um ou mais atividades da empresa, ou o seu funcionamento normal em outra localidade, não significa a obrigação de manutenção do contrato de emprego com o cipeiro, caso caracterizado o motivo técnico ou econômico que decorre, por exemplo da simples extinção de um setor da empresa, de uma atividade empresarial ou de uma unidade industrial, juntamente com o posto de trabalho ocupado pelo cipeiro.

Felizmente, a jurisprudência é farta de exemplos em que, embora não extinto o estabelecimento, reconheceu-se a inviabilização do contrato de trabalho por alterações ocorridas no local de trabalho de modo a afastar a lógica do contrato de trabalho (trabalho X salário), motivo pelo qual se recomenda ao empregador que, antes de curvar-se a incorretas interpretações contidas em algumas decisões, faça valer o seu direito, analisando com serenidade cada hipótese aplicando o princípio geral previsto no artigo 165 da CLT, do qual a correta interpretação da Súmula não poderá afastar-se.


Porto Alegre, 09 de março de 2009.
Marco Antonio Aparecido de Lima
Lima Advogados Associados – Assessoria e Consultoria Jurídica



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